terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Movimento Perpétuo (Associativo)

De há algum tempo para cá, tenho vindo a tomar contacto com o movimento associativo em torno dos estudantes de Direito. Primeiro, numa acepção mais localizada, através de uma participação activa no NED/AAC, ao longo dos últimos dois anos; depois, num âmbito mais difuso, ao acompanhar os trabalhos recentes das Académicas de Direito de Norte a Sul no âmbito da resolução do probelma do exame de acesso ao estágio da Ordem dos Advogados, levados a cabo nos últimos seis meses.

Confesso que, ultimamente, me tem despertado particular interesse esta derradeira temática da representação nacional dos interesses dos estudantes de Direito. Não escondo a minha profunda surpresa com as realidades que encontrei ao me debruçar mais cuidadosamente sobre essa temática. Com efeito, ao entrar no comboio que me levaria a Lisboa pela primeira vez, não podia deixar de reflectir sobre o assunto. Mas, ao mesmo tempo, queria aproveitar para observar o funcionamento das outras Académicas, qual aluno em visita de estudo, para procurar perceber até que ponto estaria a nossa Académica a perder, até comparativamente, o Brio e o fulgor que sempre a caracterizaram; queria perceber se o modelo orgânico vigente nas outras academias provocava, ou não, uma profunda diferenciação que justificasse o repensar do nosso modelo.

Posso dizer-vos que cheguei a conclusões incríveis (ou nem tanto).

Ao chegar a Lisboa, dirigimo-nos para a Cidade Universitária, tendo sido recebidos pela Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa (Clássica). Não foi surpresa constatar que seríamos os únicos a vestir a nossa Academia naquele dia: nestas andanças, a capa e batina estavam, com efeito, reservados aos Doutores de Coimbra, quase sem excepção. Seguidamente, foram-nos mostradas as portentosas instalações da AAFDL, que só poderíamos comparar com a nossa casa (emprestada pela Reitoria) na Rua Padre António Vieira. O resto do dia, até por volta das 15h, foi ocupado pelo almoço (ao cuidado da AAFDL) e pela troca de impressões com os colegas das restantes académicas então presentes. Após as 15h, teve lugar a nossa concentração à porta da Ordem dos Advogados, onde se realizou uma reunião entre os presidentes das Académicas e do NED/AAC e o Senhor Bastonário, da qual resultariam conclusões e promessas que este, em tempo útil, se esqueceria, com a naturalidade que o caracteriza nestas situações, de cumprir.

Pelo meio, foi de grande riqueza a partilha de experiências, a comparação entre Coimbra e Lisboa, a reflexão sobre a Federação Nacional de Estudantes de Direito, agora a um passo da extinção, a vexata quaestio da Federação vs Associação.

Por um lado, foi interessante notar que a tão propugnada diferença entre públicas e privadas se esbatia no contacto entre as Académicas. Foi até uma bandeira da FNED, tendo sido vedada a participação nesse projecto às Académicas das universidades privadas. Naquele dia, tivemos a força que tivemos por estarmos todos na mesma mesa.

Por outro lado, foi igualmente interessante comparar a realidade da estruturação por Núcleos (com uma Direcção-Geral hierarquicamente superior) com a realidade da AAL e das associações académicas de cada faculdade. Era notório o contraste financeiro e estrutural entre o NED/AAC e as Associações Académicas (o melhor exemplo seria a AAFDL – com um orçamento anual que lhes permite manter até uma editora própria!) sem que isso, em momento algum ou de forma alguma, diminuísse ou diluísse o nosso peso neste processo. Ficou a ideia de que Coimbra se projecta lá fora, sobretudo, na qualidade e no peso politico-associativo que encerra. Aliás, nunca fui a um ENDA, mas acredito que seja fácil chegar a essa mesma constatação.

Daí para cá, já nos encontrámos umas quantas vezes para resolver os nossos problemas comuns. Aliás, estes encontros têem sido cada vez mais frequentes. O último de que tenho memória foi a 26 de Novembro, dia de eleições para a Ordem, em que estivemos, frente ao edifício da OA, desde as 10h da manhã às 23h30.


O Associativismo é feito e vivido por aqueles que querem que assim o seja. Não precisámos que houvesse uma FNED activa para identificar o nosso objectivo comum e encetar esforços para o atingir. Não precisámos de personalidade jurídica autónoma para aderir a este movimento e orientá-lo, como é apanágio da nossa Associação Académica de Coimbra. Não precisámos de poder económico para sermos ouvidos, respeitados e encorajados a tomar uma atitude.

Houve um inconformismo. Houve uma consonância como há muito não havia entre os estudantes de Direito de Portugal. Não se discriminaram IES públicas de privadas e concordatárias, não houve segregações nem impeditivos formais de uma vontade que era a Nossa. Reconhecemo-nos como iguais, apesar de tudo o que nos possa separar noutros ambientes. Não havia interesses eleitorais porque nem havia um órgão para ser eleito. Neste percurso, reduzimos o Associativismo ao seu estado puro. Não quero com isto dizer que um modelo de anarquia é válido porque não é disso que se trata: houve um respeito mútuo e um focalizar nos objectivos comuns, relegando para segundo plano a discussão de um modelo orgânico mais elaborado. E assim nasceu a UNED – União Nacional dos Estudantes de Direito.

Será sempre necessária uma estrutura organizativa mais ou menos hierarquizada para melhor acautelar estes interesses, disso não haja dúvida. O que se quer arguir aqui é que parece conditio sine qua non de um projecto associativo esta polarização axiológico-valorativa que pude observar neste processo. Uma estrutura orgânica desligada deste elemento fundamental é uma carcaça, um peso morto que não serve os interesses a que (virtualmente) se destina.

3 comentários:

  1. Excelente texto Paulo! Visão do interior das vivências associativas, que às vezes nós (eu também, confesso) criticamos ou elogiamos unicamente com uma certeza que às vezes temos e que no fundo nada de realidade tem.

    Era espectacular que, como tanto lembrou a Mafalda, voltássemos ao VERDADEIRO E PURO (gosto da expressão) ASSOCIATIVISMO!!!!!!

    Mas em concreto qual é o objectivo, missões, fins, etc. da UNED?
    Como funciona?

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  2. Muito obrigado, José!
    Aproveito para retribuir o elogio: de facto, é importante (para não dizer fundamental) não desligar nunca a Academia da Universidade e é de louvar que neste Espaço, que me parece estar cada vez mais a ganhar o Seu espaço, também se atente a essa necessidade. :)

    Bem, para te responder a essa (óptima) questão, vou tentar oferecer-te a perspectiva da nossa casa. Assim sendo, vamos por partes: é fácil compreender que as questões específicas de cada área do Saber ministrada pelas universidades nacionais escapam, por vezes, ao âmbito de intervenção de uma Académica comprometida com os interesses de uma colectividade mais abrangente como é o caso da nossa. Se reparares, no contexto de uma actuação focalizada em problemas estruturantes do Ensino Superior e da Sociedade Civil, acaba por ser um encargo porventura demasiado exigente ou demasiado especializado e é por isso que entendemos justa a delegação de competências em matérias que se revistam de tal especialidade nos Núcleos das áreas respectivas (não que, nesta matéria específica, a iniciativa não tenha partido de nós, mas é o procedimento habitual).

    Estes problemas podem ser de foro interno(quando resultam de imposições da instituição de ensino de cujos estudantes é representante o Núcleo ou Académica em questão) ou de foro externo(quando respeitem a matérias de âmbito nacional, como é o caso desta querela com a OA).

    Internamente, já percebeste como funciona. Externamente, estes problemas podem e devem ser discutidos pela globalidade de quem os vive. São, frequentemente, questões nas quais é muito difícil obter uma resolução sem primeiro haver um consenso generalizado ou uma posição (política) de força perante a(s) entidade(s) competente(s) para apreciar essas questões.

    Assim, surgem plataformas nacionais de concertação dos estudantes de cada área. São exemplos a Federação Nacional de Estudantes de Engenharia Civil (FNEEC) e a Associação Portuguesa de Estudantes de Farmácia (APEF).

    Longe de funcionar como grémios, acabam por poder encerrar um vasto leque de competências, entre as quais é habitual encontrar, por exemplo, a realização dos Encontros Nacionais de Estudantes. Mas também deve uma palavra a dizer no acesso ao mercado de trabalho, nos problemas estruturais do ensino da sua área específica de saber em Portugal, etc.

    Focando-nos mais na situação de Direito, o que se passou foi que a plataforma nacional, a FNED, se tornou inoperante por uma série de razões que não vale a pena explicar aqui. E esta questão do exame de acesso ao estágio obrigou a que as académicas de Direito, quer das universidades públicas como das públicas não estatais ou das privadas, reagissem a um estado de coisas que prejudicava irremediavelmente os interesses dos estudantes que representamos.
    E, posto isto, criou-se uma instituição intermédia, por assim dizer. Um corpo desprovido de personalidade jurídica, de carácter transitório, onde as deliberações são tomadas quase por consenso, em que todas as académicas se sentam, como iguais, e discutem este problema e os que forem aparecendo até à consagração de outra solução estrutural. Uma entidade que é, na realidade, um símbolo da nossa União e do nosso esforço conjunto nesta matéria.

    Acredito que, dentro de não muito tempo, este projecto consiga grandes vitórias.

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