sexta-feira, 25 de março de 2011

Desabafo

Este fim de Março está a ser uma época triste.

Não me revejo em estudantes que, reivindicando direitos dos seus colegas, montam uma tenda de ciganos à Porta Férrea. Assim como não me revejo numa estrutura representativa que, por cair na sede de poder e na estratégia da crítica desmesurada, leva conscientemente o país a uma crise política.

Estes dois acontecimentos partilham uma raiz comum – descrença. E vai muito além de uma descrença para com os políticos no poder, é uma descrença para com os nossos iguais e para com a possibilidade de mudança. É uma descrença na importância e relevo da imagem de Portugal e dos Estudantes de Coimbra. É uma descrença na tão aclamada democracia.

Falta um inimigo comum e uma união acima de individualizações. Falta passar por cima de muitos orgulhos e proclamadas “coerências”. Falta quem seja isente de politiquices. Muitas críticas aponto eu ao Governo. Muita compreensão manifesto para com os motivos justificativos do Boicote. Mas não é o que se passou esta semana por que eu ansiava, muito menos aquilo de que todos nós precisávamos. Presentearam-nos com irresponsabilidade e quando olho em redor só vejo facções de pessoas que se revoltam, alegando um objectivo comum, acabando por se virar uns contra os outros.

É a perversão do sistema apoiada por aqueles que com ele sofrem e aqui repito – o que mais custa é o sistema ter chegado a este ponto por a voz popular ao longo dos tempos ter evoluído no sentido de uma apatia e de uma inconsciência cívica, com repercussões a nível de votos e abstenções, habituada a dados garantidos, excepcionada por extremismos.

6 comentários:

  1. Concordo totalmente, Mafalda.
    Penso, aliás, que os políticos que fazem parte de partidos com assento parlamentar não estão minimamente preocupados com o interesse nacional (a tal hipocrisia...), mas com o seu próprio interesse. Tal verifica-se, desde logo, com o facto de todos eles, sem excepção, desejarem eleições antecipadas, ao invés de procurarem uma solução que podesse uni-los verdadeiramente. Creio que, dessa forma, mais facilmente conseguiriam combater a descrença e a falta de confiança que as pessoas cada vez mais manifestam em relação às Instituições (isto, evidentemente, partindo do princípio que neste aspecto que os políticos estão interessados).
    Penso que o caminho que está a ser seguido é muito perigoso, com uma total despreocupação com as pessoas. Talvez por esse motivo há quem diga sem constrangimentos que prefere que Salazar regresse.

    http://sic.sapo.pt/online/video/informacao/noticias-pais/2011/3/portugueses-entrevistados-pela-sic-dizem-se-cansados-do-actual-governo-e-temem-o-futuro24-03-2011-14.htm

    ResponderEliminar
  2. Mafalda, aqui reitero o meu desagrado com a expressão "tenda de ciganos". Era um estendal, vá. :p
    No resto inclino-me a concordar.
    Infelizmente o extremismos estão a tomar conta da vida pública. De um lado temos os que defendem a eterna luta, mas se esquecem da democracia e da solidariedade, de outro os que repudiam violentamente e em nome de um conceito de democracia que eu desconheço, a extinção de tais pessoas, temos ainda os que simplesmente não se importam com qualquer espécie de luta e se fecham no seu egoísmo ou se deixam levar pelo protesto fácil e por fim, os eternos diletantes como nós.
    Fartamo-nos de falar, de escrever e até de sonhar, mas quando nos devia tocar a nós intervir parece que nunca é a altura certa nem existem os meios adequados.
    O facto é que o momento é perfeito e que não podemos ficar indiferentes ao papel que cada um pode assumir para mudar os estado de coisas.
    Mas mais uma vez, são palavras...

    ResponderEliminar
  3. Enganei-me lá em cima: pudesse e não "podesse", como escrevi.

    ResponderEliminar
  4. Parece-me que a perversão do sistema apoia-se na perversidade de quem o sustenta. De todos nós no geral. Pois as pessoas lutam contra quê ? Apontam o dedo a uma determinada faccção política, como se o mal do país fosse um mal de terminologia. Jogos de semãntica não tiram fome nem dão trabalho a ninguém. O grande mal é que não se trabalha e há falta de trabalho.

    Na televisão fala-se em números elevadíssimos de desemprego, mas a mim parece-me que a quantidade de pessoas que não trabalha é bem maior. Quantas serão as pessoas que trabalham em função da remuneração em vez de o fazerem pelo gosto e pelo seu valor real para a comunidade ? Se alguém financiasse a recolha de pedritas do chão, aí teríamos mais um emprego, mais um trabalhador respeitável. Não me parece que um emprego cujo valor apenas vem do facto de ser remunerado possa ser considerado trabalho. Somos um país de serviços, onde pouco é o que se produz. Há muito emprego e pouco trabalho. E então, pergunto agora, quantos serão os que realmente trabalham neste país ? Quantos serão os que realmente contribuem para a comunidade ?

    Com trabalhadores assim, que iríamos esperar dos nossos políticos ? Também aqui, as motivações se prendem com as diversas remunerações, o seu verdadeiro valor esquecido, é apenas uma fachada, uma pele que se veste. Tal como o Boicote e a respectiva manifestação, é uma pele que se veste por um dia, mascaramo-nos de solidários e acenamos os nossos cartazes e palavras vazias.

    O que falta é genuidade, na política e no dia-a-dia. O que faltam são exemplos.

    Na última assembleia magna, em resposta a alguém que apelou a procurarmos os nossos próprios meios de apoiar os nossos colegas em falta ouvi (tal como todos ouviram) alguém dizer que isso seria desresponsabilizar o governo, que essa é a obrigação do estado. E aí então percebi, as pessoas não se vêm como parte do estado, preferem lavar as mãos de tal fardo, preferem que a sua responsabilidade comece e acabe no acto de votar e no acenar de bandeiras e palavras bonitas. A verdade é que também nós somos parte integrante deste sistema e, no que o estado está em falta devemos nós dar o exemplo, talvez aí então teremos nas próximas gerações uma nova raça de políticos - uma com verdadeiro pedigree ao invés deste grupo de rafeiros dos bons costumes e do parecer bem.


    Precisamos de exemplos genúinos de civismo, precisamos da verdade e não do faz-de-conta. O momento é sempre perfeito para agir correctamente, fazemos o que podemos e o que podemos fazer é viver de acordo com o que dizemos, podemos ser todos hipócritas mas ao menos somos hipócritas que se esforçam. Forçados da hipocrisia, para que dela venha a genuidade.

    ResponderEliminar
  5. Eram 8.45 quando na quinta cheguei à Porta Férrea e... senti-me sozinho. Sozinho porque não sabia se rir pelo espectáculo circense que ali estava montado; não sabia se chorar por ver a academia dividida.

    Depois pus-me a contar as tendas, aquela facção de estudantes e a outra dos estudantes de capa e batina.

    E tirei uma conclusão: a desunião desfaz a força! De um lado aquela (gostemos ou não) que é a nossa representante máxima estudantil; do outro, o espectáculo cómico (vamos lá pelos eufemismos) ali produzido. Se havia sido prometido ao Reitor uma acção democrática, livre, sem repressão ou limitação ao direito de todos (seja o direito à greve/boicote, seja o direito a ir às aulas), porquê um grupo de alunos mudar as regras? Afinal o que ficou decidido em Magna? E não me venham dizer que a porta do auditório estava aberta e assim esses direitos estavam preenchido. Errado! Aqui conta o princípio, a forma de actuar, de estar e ser Universidade de Coimbra; o respeito pela porta férrea, porque aqueles que tentam unir, pela luta no seu todo.

    Contudo, não foi só esta facção de estudantes que de alguma forma, a meu ver, não esteve tão bem. Quando cheguei ao "acampamento" eram menos os trajados que aqueles; depois foram chegando mais alguns. Suficientes? Se lutamos pelas bolsas, onde andam os bolseiros? Se lutamos por uma acção social mais justa, onde estavam os estudantes que perfazem mais de 20mil na UC? Se queremos mais qualidade do ponto de vista de infra-estruturas e na pedagogia, onde estávamos nós?

    Como o Ricardo disse, somos NÓS que temos que dar o exemplo... a cidadania não é ficar em casa e deixar os outros lutar... a democracia não é deixar que os outros falem por nós... o civismo não é comentar, criticar, e dizermos que não vale a pena lutar.

    Perdoem-me o meu "desabafo"... talvez um pouco mais frio, mais sentido, mas efectivamente acreditei numa UC mais unida, numa AAC mais coesa e em estudantes mais capazes de remar para o mesmo lado. O que poderia ter sido um dia de enorme sucesso, tornou-se na luta de cada um pelo seu posto: fosse no quentinho do lar, no lugar dirigente, num metro quadrado de tenda ou numa fila para degustar uma febra.

    Onde chegaremos assim?

    ResponderEliminar
  6. Gostaria de dizer apenas mais umas coisas.
    Primeiro, eu não concordei com o boicote, apesar de ter estado pela praça e de ter ido à assembleia magna, não escondi a minha opinião.

    Perguntamo-nos porque teve a manifestação tão pouca afluência ?
    Os panfletos, e toda a informação que me chegou ás mãos falava num boicote às aulas. O Boicote pelo boicote, e não houve qualquer cuidado pelas palavras escolhidas, nem um apelar às razões certas para a manifestação.

    Tivemos o reitor a libertar-nos das aulas para que possamos fazer a nossa manifestação, para que todos possam vir, não para que pudéssemos fazer gazeta e ir à festa. E no entanto no panfleto a grande palavra de marca era o BOICOTE. Ouvi alguém dizer que o facto de não termos faltas só enfraquecia o boicote, como se uma coisa que só prejudica os manifestantes fosse fazer mossa nas instituições que pretendemos pressionar. Devia se ter apelado à manifestação e não ao boicote, que seria apenas um meio para nos podermos manifestar em massa a um dia de semana. Como acabou isto ? Uma percentagem enorme de pessoas fez boicote às aulas, usufruiu do dia livre, e foi para casa convencido que a sua acção de solidariedade/manifestação terminava ali. Não só acabamos com uma manifestação frouxa como ainda patrocinámos a falsa cidadania.

    O que gostaria de ver era uma sensabilização das outras classes, principalmente a dos professores, a academia não é só dos alunos, é de todos que tomam parte neste organismo. As lutas vão e voltam, mas a coesam fica, e a melhor maneira de lutar é termos uma universidade e uma comunidade estudantil forte e coesa. Não é esse o desejo que vejo patente nas magnas a que tenho assistido.

    ResponderEliminar